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segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Seria Jesus o Messias esperado?


O cumprimento de profecias bíblicas é um dos pilares principais da argumentação apologética que pretende provar o caráter messiânico da vida de Jesus/Yeshua e suas implicações no que tange a relevância desse fato para o contexto religioso cristão. As especificidades de tais profecias e suas aplicações frente à ótica judaica são questionáveis e merecem aqui considerações elucidativas e técnicas que visam o real entendimento do tema. A Torah (leia-se bíblia) está repleta de tais textos que narram eventos futuros ― Os Sefrêi Neviim (Livros dos Profetas) contém muitas declarações proféticas e não proféticas, assim como todo o Tanach (Bíblia Hebraica) ― E muitos desses eventos perdem seu teor relevante quando são separados de seus contextos, servindo assim como subsídio para a construção imaginária das profecias relacionadas ao messias.

Gostaria de analisar, a priori, a questão do nascimento de Jesus/Yeshua e as supostas profecias relacionadas a esse evento singular. Tomo como ponto de partida o livro do profeta Isaias¹ capítulo 7, verso 14, que diz: “Eis pois que o Eterno, Ele mesmo, vos dará um sinal: eis que a moça grávida dará à luz um filho e o chamará Imanuel (‘D-us conosco’). O leitor mais atendo e familiarizado com esse verso dos profetas perceberá que sob essa tradução não podemos dar suporte para doutrinas que pretendem enfatizar o caráter divino do evento e ainda da natureza do menino supracitado pois, o teor metafísico dele está ausente. Não restam dúvidas de que o texto não se encaixa no evento transcendente do nascimento do messias do novo testamento, não se a tradução for essa. Mas se aplicarmos a tradução usual do texto, como por exemplo a de João Ferreira de Almeida², perceberemos a mudança de um plano natural, físico e objetivo para um transcendente, metafísico, subjetivo: “Portanto, o Senhor mesmo vos dará um sinal: eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho e lhe chamará Emanuel”. A diferença se dá por conta da tradução da palavra Almah que na versão de Almeida é traduzida como virgem ou seja, uma mulher que não teve relacionamento sexual com um homem sugerindo então que o fato dela dar à luz seria algo miraculoso. A palavra Almah em hebraico significa jovem, moça, donzela ou ainda uma mulher recém casada e não necessariamente uma virgem. Como o texto informa que a mesma estava grávida (Harah) não reside aqui qualquer possibilidade dela ainda ser virgem. A palavra hebraica para virgem é Betulah, essa sim ligada especificamente a questão da virgindade tendo sua raiz na palavra ímem. A palavra Betulah era conhecida do autor já que a mesma aparece em diversos³ versos do livro como virgem, não havendo a possibilidade de engano por parte do mesmo.

1 Bíblia Hebraica, Editora Sêfer - 2006.
2 A Bíblia Sagrada, tradução de João ferreira de Almeida. Sociedade Bíblica do Brasil – 1996.
3 Veja Isaias 23:12; 37:22; 47:1 e 62:5.

A suposta profecia que alude ao nascimento virginal do messias salvador perde sua validade se levarmos em consideração o fato já mostrado acima e ainda o cumprimento das palavras a ela relacionadas que se encontra no capítulo 8 do mesmo livro. Antes de irmos ao texto vale observar que o capítulo 7 de Isaías narra o temor do rei de Judah, Ahaz (Acaz no português) frente ao iminente ataque a Jerusalém por parte dos reis da Assíria e de Israel (Reino do Norte), a saber, Retsin e Pêcah. Nesse contexto D-us intervém prometendo que isso não ocorreria e que Ele daria um sinal, o nascimento do menino. Assim, no capítulo 8, o fato se cumpre levando em consideração os termos narrados no capítulo anterior que obviamente não se referem ao Mashiach (messias). Veja: “Vim à profetiza e ela concebeu e deu à luz um filho...” Diante do fato não existe a possibilidade desse texto possuir status de profecia messiânica nem mesmo de ser atribuído a Jesus/Yeshua.

Uma outra argumentação recorrente nesses versos é a de que a palavra hebraica Oth, que significa sinal, se refere a um evento miraculoso, transcendente, com seu paralelo no novo testamento. Vale aqui colocar que a palavra é genérica e não se refere necessariamente a um evento dessa natureza, o que o texto vai confirmar. O que existe de anormal em uma mulher, que estava grávida, dar à luz? O fato ganha repercussão sobrenatural por conta da narrativa do novo testamento ― alusiva ao encontro de um “anjo do Senhor” com e José ― no qual a gravidez de Maria é atribuída ao Espírito Santo e não a um pai biológico, nesse caso o próprio José (Mat.1:18-25). O texto de Mateus faz questão de ligar o evento à suposta profecia de Isaías para lhe conferir caráter bíblico-profético e transcendente: “Ora, tudo isto aconteceu para que se cumprisse o que fora dito pelo Senhor por intermédio do profeta (?): Eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho, e ele será chamado pelo nome de Emanuel”. Outro problema referente a essa suposta profecia do messias é o fato de Jesus/Yeshua nunca ter sido chamado de Emanuel como supõe a profecia de Isaías.

Ainda em relação ao nascimento de Jesus/Yeshua outro texto é usado como argumentação profética referente ao seu caráter messiânico. O texto está no profeta Mihal (Miquéias em português) 5:2 e faz alusão ao messias nascer em Belém: “E tu, Belém Efrata, pequena demais para chegar a estar entre os milhares de Judá, de ti me sairá àquele que há de tornar-se governador de Israel, cuja origem é desde tempos primitivos, desde os dias do tempo indefinido”. No texto o messias irá governar em Israel o que não se aplica a Jesus/Yeshua, pois o mesmo nunca reinou em Israel e ainda chegou a dizer que seu reino não era deste mundo. Um dos atributos do messias judeu será reinar em Israel sendo o mesmo descendente de David HaMelekh (Rei David) o que não chega a ser o caso de Jesus/Yeshua.

Continua ...

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